Aparício Torelli

Disse o profeta:

Máximas do Barão de Itararé


De onde menos se espera, daí é que não sai nada.

Mais vale um galo no terreiro do que dois na testa.

Quem empresta, adeus...

Dizes-me com quem andas e eu te direi se vou contigo.

Pobre, quando mete a mão no bolso, só tira os cinco dedos.

Quando pobre come frango, um dos dois está doente.

Genro é um homem casado com uma mulher cuja mãe se mete em tudo.

Quem só fala dos grandes, pequeno fica.

Viúva rica, com um olho chora e com o outro se explica.

Depois do governo ge-gê, o Brasil terá um governo ga-gá. ( Ge-gê: apelido de Getulio Vargas. Ga-gá: referia-se às duas primeiras letras no sobrenome do novo presidente, Eurico Gaspar Dutra).

Um bom jornalista é um sujeito que esvazia totalmente a cabeça para o dono do jornal encher nababescamente a barriga.

Neurastenia é doença de gente rica. Pobre neurastênico é malcriado.

O voto deve ser rigorosamente secreto. Só assim , afinal, o eleitor não terá vergonha de votar no seu candidato.

Os juros são o perfume do capital.

Urçamento é uma conta que se faz para saveire como debemos aplicaire o dinheiro que já gastamos.

Negociata é todo bom negócio para o qual não fomos convidados.

O banco é uma instituição que empresta dinheiro à gente se a gente apresentar provas suficientes de que não precisa de dinheiro.

Cobra é um animal careca com ondulação permanente.

Tudo seria fácil se não fossem as dificuldades.

Sábio é o homem que chega a ter consciência da sua ignorância.

Há seguramente um prazer em ser louco que só os loucos conhecem.

É mais fácil sustentar dez filhos que um vício.

A esperança é o pão sem manteiga dos desgraçados.

Adolescência é a idade em que o garoto se recusa a acreditar que um dia ficará chato como o pai.

Senso de humor é o sentimento que faz você rir daquilo que o deixaria louco de raiva se acontecesse com você.

A televisão é a maior maravilha da ciência a serviço da imbecilidade humana.

Este mundo é redondo, mas está ficando muito chato.

Pão, quanto mais quente, mais fresco.

A forca é o mais desagradável dos instrumentos de corda.


Extraído de "Máximas e Mínimas do Barão de Itararé", Distribuidora Record de Serviços de Imprensa - Rio de Janeiro, 1985, págs. 27 e 28, coletânea organizada por Afonso Félix de Souza.

Disse o profeta:

Trata-se do seguinte, meu senhor. Eu estou fodido mesmo. No meu tempo, o senhor entende, apesar dos 35 anos de idade, estou sofrendo de uma doença chamada melancolia precoce, mas como ia dizendo, no meu tempo fui educado pra achar vergonhoso pedir. Pedir: esmola, ajudinha, troco e o que fosse. Em último caso, pedir comida, se a coisa estivesse muito feia, podia. E todo mundo dava.
Agora o lema é outro: estou pedindo, não estou roubando. Vejam só. Uma espécie de redução de dano, na violência implítica da frase. Na verdade o malaco te diz, é: melhor me dar que senão eu vou acabar levando sua carteira. E assim vai.
Hoje fui comer minha maldita coxinha e minha meio quente coca-cola, num boteco por aqui e em menos de 10 minutos, levei duas bordejadas. Uma com direito a mulher doente de mentira e outra de menino acostumadinho a pedir desde novinho, querendo um rango na faixa. Acho que, por causa do feriado tinha menos otário na rua e sobrou pro gordo burro aqui.
Aí vem aquela culpa disfarçada de consciência política, falando que o país está uma merda, que não tem emprego, que falta escola e oportunidade. Acho que os dez milhões de empregos que o Lula prometeu, são só pros pedintes, mendigos e flanelinhas poderem diminuir a concorrência nas ruas.
Vai enchendo saco mesmo. Vai dando vontade de sair correndo.
Fui dizer umas coisas dessas pro dono do boteco e ele me conta da sua infância. Que de menino já vendia amendoim, que aos 14 anos foi expulso de casa pela madrasta...
E eu vi o cara com o comércio dele, com um filho ajudando, bem vestido, bem alimentado.
Daí lembrei do lance do tráfico e da prostituição. Pensei no salário mínimo. Contei minhas moedas de 10 no bolso que eu catei pela casa. Legal, vai dar. Paguei a conta e vim aqui desabafar.
Falta despertar desse pesadelo. Será que lá no outro hemisfério também é assim?
Quem sabe vou ser pedinte por lá. É isso, vou jogar no outro time. Cuidar de mercedes na Alemanha.


Disse o profeta:

Não põe corda no meu bloco
não vem com teu carro-chefe
não dá ordem ao pessoal


Não traz lema nem divisa
que a gente não precisa
que organizem nosso carnaval


Não sou candidato a nada
meu negócio é madrugada
mas meu coração não se conforma


O meu peito é do contra
e por isso mete bronca
neste samba plataforma


Por um bloco
que derrube esse coreto
Por passistas à vontade
que não dancem o minueto


Por um bloco
sem bandeira ou fingimento
que balance e bagunce
o desfile e o julgamento


Por um bloco
que aumente o movimento
que sacuda e arrebente
o cordão de isolamento


Não põe no meu...

João Bosco e Aldir Blanc
Disse o profeta:

E tem mais esse figura aqui:


Porque eu devia pegar leve. Não tenho mais idade pra fazer diferente. É só um jeito de olhar com ternura pela janela quando a tempestade se anuncia. Mas quem disse que eu sou capaz de ficar na minha quando a temperatura sobe? Eu sempre aposto comigo e perco. Tem certas pessoas no mundo que não nasceram pra ficar mocozadas. Mas mesmo assim eu quero acreditar. E então insisto e ultrapasso a linha. Já não tenho pra onde voltar. Tem gente que tem um jardim. Ou um papagaio. Ou uma tartaruga. Eu só tenho o hálito frio de um fantasma que diz que não há com o que se preocupar. Então eu não espero que me convidem. Eu furo o bloqueio. Eu não tenho esqueletos no armário. Nem um jardim esperando por mim. Ou um papagaio. Ou uma tartaruga. Eu só tenho uma ansiedade filha da puta que faz com que a minha temperatura suba. E acreditem: nesse momento não levo nenhuma vantagem. I have to dream alone.

Mais do Bortolotto:

http://atirenodramaturgo.zip.net/
Disse o profeta:

Achei esse cara aqui na rede:

Sou um cara rústico que se comove com os fregueses phodidos como eu. Enxergo beleza num trapo. Sou um erro desovado em terra alheia. Phui um marmiteiro mastigando meu ovo phrito, meu biphe acebolado, meu feijão com osso atrás do balcão enquanto ratinhos deambulavam porentre prateleiras empenadas. Então o que escrevo são vísceras e não tem outro jeito. Hoje eu estou chorão pra caralho.
P.S.
Caso alguém tenha um subemprego aí prum cara especializado em porra nenhuma e mandar a passagem eu topo. Desde que não seja um trampo pesado demais, pois de peso estou pharto.

Interessante. Interessado?
http://www.hypperghettos.blogger.com.br
Disse o profeta:

Eu nem sei bem porque detesto esse burburinho do cotidiano pela casa. A TV ligada no jornal do almoço, o barulho de metais que vem da cozinha em função, o telefone que toca perguntando porque a vida continua igual, os carros entrando e saindo da casa.
Mas aí da rua ao lado da janela, ouço a voz do nosso louco da vila, sugerindo ao ser imaginário de seu delírio, que vá com deus...
Quando fico sozinho, as únicas informações vêm da TV e da internet. Mesmo quando violentas, não assustam. Basta um clic e elas desaparecem. As pessoas, não.
A virtualidade me cai bem demais. Solidão iluminada, longe dessa idade das trevas:

Quando eu chego em casa nada me consola, você está sempre aflita.

Então essa galinha chamada vida, bota um ovo.
E eu corro pra escrever sobre tudo isso.
Disse o profeta:

CADA LUGAR NA SUA COISA
(SERGIO SAMPAIO)

UM LIVRO DE POESIA NA GAVETA
NÃO ADIANTA NADA
LUGAR DE POESIA É NA CALÇADA
LUGAR DE QUADRO É NA EXPOSIÇÃO
LUGAR DE MÚSICA É NO RÁDIO
ATOR SE VÊ NO PALCO E NA TELEVISÃO
O PEIXE É NO MAR
LUGAR DE SAMBA ENREDO É NO ASFALTO
LUGAR DE SAMBA ENREDO É NO ASFALTO

AONDE VAI O PÉ ARRASTA O SALTO
LUGAR DE SAMBA ENREDO É NO ASFALTO
AONDE A PÉ VAI SE GASTA SOLA
LUGAR DE SAMBA ENREDO É NA ESCOLA
Disse o profeta:

Quando o Carnaval Chegar
Chico Buarque

Quem me vê sempre parado, distante garante que eu não sei sambar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Eu tô só vendo, sabendo, sentindo, escutando, não posso falar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Eu vejo as pernas de louça da moça, que passa e não posso pegar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Há quanto tempo desejo seu beijo molhado de maracujá
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
E quem me ofende, humilhando, pisando, pensando que eu vou aturar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
E quem me vê apanhando da vida duvida que eu vá revidar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Eu vejo a barra do dia surgindo pedindo pra gente cantar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Eu tenho tanta alegria adiada, abafada, quem dera gritar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar



Disse o profeta:

Eu fiquei pensando, prá que que serve um guerreiro sem guerra?
Esse veneno, essa raiva toda acumulada, vai pra onde?
Eu lembrei do Apocalipse Now.
A infernal espera.

Mas sigo aqui. Firme na areia movediça. Dos seriados dos anos 60. Do túnel do tempo, da viagem ao fundo do mar, do batman e do perdidos no espaço.
Perigo, perigo.

Mas depois de provocar, eu mal aguento o contravento.

Fica quieto, coração de leão. Guarda esta espada, flash gordon.

Fica na tua, kafka, a barata.

Nilo Neto
Disse o profeta:

“Como pode, ó mártir, o bêbado dormir, ó heroína, sem babar, ó santíssima?”
Dalton Trevisan


A besta-fera gamada pela mais doce gatinha do bairro. Barba cerrada roçando a bochechinha de boneca chinesa:
- Ai benzinho, cê tá com um bafão de vinho!
- Não me incomoda. Vem cá dar um beijo.
Boca molhada, língua mole, olhos vermelhos. Sabe Deus quantos bares.
O Semi-humano emite grunhidos sem sentido, como se falasse o idioma das cavernas.
- Vem que hoje eu tô aceso.
- No café, no almoço, na janta, assim me mata.
- E não é amor?
- Sei não, parece pecado.
Mas já é tarde. Meio arrastada, meio assustada, ela sucumbe. A Besta-fera lambe os beiços e cai num sono profundo, roncando de acordar criancinha chorando.
- Assim dormindo ele parece tão inocente!
Disse o profeta:

Já andava precisando mesmo deste espaço virtual para vomitar sandices.
E convido aos infelizes adaptados normopatas e despirem-se dos últimos suspiros de verdades pré-fabricadas e
vomitarem aqui a rebarba da amargura que é viver
nessa sociedade essencialmente mentirosa e inoperante.

rerere