Roberto Freire


Não resta mais dúvida alguma para mim que a necessidade de poder absoluto corresponde sempre a uma impossibilidade de se viver os prazeres relativos da existência cotidiana. A perda do prazer espontâneo cria nas pessoas, por mecanismos psicopatológicos de compensação perversa, a necessidade compulsiva de poder. Todo tipo de pode: o físico, o psicológico, o afetivo, o sexual, o econômico, o político. A forma de prazer que ainda sobraria nessas pessoas seria o de natureza sadomasoquista e paranóica: necessidade da dor alheia ou própria para se alcançar o prazer, necessidade essa comandada pelo fato de se sentirem superiores, especiais, e que por isso devem estar em constante estado de defesa e ataque contra inimigos, usando para isso o máximo requinte de crueldade e extrema violência. Assim, o prazer-dor da dominação, de mandar, de se apropriar e de explorar, corresponde à dor-prazer de ser dominado, de ser mandado, de ser apropriado e de ser explorado. Verifica-se que o exercício desse tipo de poder substitui parcial e pervertidamente o prazer. Funciona em forma de cadeia nas formas sociais autoritárias, fazendo surgir o gosto também patológico de ser dominado pelos mais poderosos.
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Para ilustrar essas idéias posso citar o que se passa na hierarquia militar dos quartéis.
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Ao analisar dessa forma os perigos e inconveniências do poder para se sentir o tesão de viver, posso estar fazendo supor que a necessidade de poder não seja coisa natural na vida dos homens. Estou me referindo criticamente apenas à necessidade de poder que procura substituir a necessidade e o exercício de prazer. Porque há, na natureza política dos homens, outras razões e outros tesões que o levam a participar em lutas de poder nas quais tentam impedir a organização social que gere poderes autoritários patológicos e genocidas.
A única coerência da direita é chupar os ossos dos pobres e jogar as carcaças fora, para engordar suas lindas contas bancárias. E nisso são insuperáveis pais da miséria e da dor de muitos, inclusive do planeta.
À esquerda ainda resta um pingo claudicante de sonho. E em alguns lugares são chupadores de ossos tão ou mais terríveis que a direita.
E onde ficamos nós, os outros que vêem e decidem não usar o poder?
Nós somos os poetas, os loucos, os bêbados e as putas.
Somos sobreviventes e temos muito pouco a perder.
Liberdade para ser um marginal e nunca sentir o gosto dos ossos. A não ser dos nossos.